Dissolução Parcial de Sociedade Limitada

Compartilhe

Existem 3 formas de dissolução parcial das sociedades: retirada, exclusão e morte de sócio. Cada uma delas dotada de suas próprias características e peculiaridades.

Morte

Não há nada no capítulo das limitadas, presente no CC/02 (Código civil de 2002), sobre o que aconteceria com a sociedade em caso de morte do sócio. Portanto, usamos a regra das sociedades simples para tratar do assunto. Isto é feito porque o art. 1.053 do CC/02 determina que no caso de omissão do capítulo das limitadas a regência será, subsidiariamente, pela regra das simples.

Posto isto, a regra geral tanto para limitadas quanto para simples “puras” é que a morte resolve a sociedade em relação ao sócio falecido.

Os herdeiros e/ou cônjuge tem direito patrimonial sobre as quotas do falecido, mas isso não dá-lhes a condição de sócios. Dizemos isto com base no art. 1.028 do CC/02, onde está presente, de maneira muito clara, o caráter intuito personae da quota. Vejamos que, em caso de morte as quotas do falecido serão liquidadas. Não obstante, é bastante comum haver confusão por parte dos herdeiros a esse respeito, pois muitos acreditam que a morte de seu antecedente lhes garante automaticamente a posição de sócio.

É interessante observar que mesmo quando a sociedade apura os haveres e paga o apurado aos herdeiros e/ou cônjuge, caso tal apuração não seja acatada por eles, cabe ainda apuração de haveres, conforme Súmulas 265 do STF:

“Na apuração de haveres não prevalece o balanço não aprovado pelo sócio falecido, excluído ou que se retirou.”

Vale ressaltar que o CC/02 não estipula prazo para os remanescentes optarem pela dissolução da sociedade no caso da morte de sócio. O que encontramos é uma lacuna no artigo 1.028, inciso II, sobre o tema (falha do legislador). Então, qual seria o prazo para os remanescentes exercerem tal direito? A nosso ver, o art. 1.029 do CC/02 deveria ser aplicado, por analogia. Sendo assim, 30 dias a partir do evento morte.

Retirada

A retirada motivada do sócio não depende de judicialização, e nem de a sociedade ter prazo determinado ou indeterminado. Basta o arquivamento, da retirada, na junta comercial para produzir os efeitos de publicização da sua saída. Feito isto, a sociedade deve, na alteração contratual seguinte, regularizar o quadro societário conforme IN 81/2020, Seção IV, 4.4.3, do DREI.

E quanto à retirada imotivada? Há discussão na doutrina sobre a aplicação do art. 1.029 CC/02 às limitadas, considerando que o art. 1.077 CC/02 é o único dentro do capitulo delas que trata da retirada e o seu conteúdo aponta situações motivadas, trazendo a ideia, para alguns doutrinadores, de que a mens legis é no sentido de limitar as retiradas ao cenário previsto em seu capítulo. Sobre isso, o STJ determinou no Resp. 1.839.078-SP, 3° TURMA, Rel. Paulo de Tarso, que o art. 1.029 se aplica as limitadas de qualquer maneira. O direito de retirada é um direito potestativo baseado em cláusula pétrea constitucional (art.5, XX, CF), e independe de regência subsidiaria pelo capítulo das simples, ou supletiva pela lei das S/A.

Portanto, se a limitada é regida subsidiariamente pelas normas das simples aplica-se o art. 1.029 CC/02 por remissão expressa do art. 1.053 CC/02. Se regida supletivamente pelas normas das S/A aplica-se, por analogia, o art. 1.029.

Os sócios remanescentes tem direito à notificação, com antecedência de 60 dias, de que o sócio pretende sair. O STJ reforça essa regra no Resp. 1.735.360 – MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, quando aponta que o contrato fica resolvido, em relação ao sócio retirante, após o transcurso do lapso temporal do art. 1.029 CC/02, devendo a data-base para apuração dos haveres levar em conta seu termo final. Não obstante, ressaltamos que não há impedimento para que os remanescentes renunciem a esse direito, produzindo a retirada efeitos imediatos.

A sociedade quando o sócio exerce o seu direito de retirada, pode, nos 30 primeiros dias (do prazo de 60 dias aos quais tem direito) da ciência da decisão, optar pela dissolução total, e nesse caso esta prevalecerá sobre aquele direito.

Atenção, pois retirada do sócio e apuração de haveres não são a mesma coisa. Uma coisa é o sócio por quebra do affectio societatis, por exemplo, exercer seu direito de retirar-se da sociedade, outra diferente é a discussão sobre quanto esse sócio deve receber por sua participação na sociedade. Portanto, havendo concordância sobre a saída do sócio, este pode sair imediatamente, ficando pendente apenas a apuração de haveres.

Exclusão

Existem várias possibilidades de exclusão de sócio em uma dissolução parcial, porém, neste artigo, vamos nos focar em apenas duas delas:

  • Exclusão por falta grave e justa causa

Podemos classifica-la em judicial ou extrajudicial. A judicial apesar de estar prevista no capítulo das sociedades simples “puras” (art. 1.030 CC/02), é aplicável as limitadas por remissão expressa do art. 1.085 CC/02.

O texto do art. 1.030 traz que o sócio pode ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações. Em uma situação hipotética, significaria dizer que um sócio faltoso, com participação de 90% no capital social, pode ser excluído por iniciativa do sócio que detenha os 10% restantes. É claro que não se trata de um sócio excluindo o outro. O sócio tem apenas a iniciativa, o direito de postular em juízo, mas o poder de exclusão pertence ao Estado, representado na figura do juiz, e após o devido processo legal.

A extrajudicial depende da previsão contratual de exclusão por justa causa. Portanto, se o sócio comete falta grave e existe a cláusula no contrato, este poderá ser excluído de forma simplificada da sociedade, mediante alteração do contrato social conforme art. 1.085, caput, CC/02.

Certo é que, a justa causa necessita de parâmetros, caso contrário o sócio majoritário poderia, arbitrariamente, abusando de sua força política, flexibiliza-la à sua conveniência, e haveria clara violação ao princípio da preservação da empresa e da proteção ao minoritário. Sendo assim, e considerando esse risco, é possível dizer que a quebra do affectio societatis, que é subjetiva, poderia ser classificada como justa causa?

Para o STJ a justa causa não é de maneira alguma a simples quebra do affectio societatis. Presente no Informativo n° 0479, o Resp. 1.129.222 – PR, julg. 28.06.2011 nos permite inferir distinção conceitual entre ambos ao ler as palavras da relatora ministra Nancy Andrighi, vejamos:

“Para exclusão judicial do sócio, não basta a alegação de quebra da affectio societatis, mas a demonstração de justa causa, ou seja, dos motivos que ocasionaram essa quebra.”

O Venire contra factum proprium reforça a proteção contra arbitrariedades e exerce função relevante na interpretação do que é justa causa, pois nos permite entender que não configura justa causa a prática de atos reiterados como padrão de normalidade e por ambos os sócios. Isto significa que atos ainda que irregulares e espúrios, se correspondem a um padrão no agir dos sócios, não pode ser usado por um deles a fim de excluir o outro, as condutas se neutralizam. É o que se infere do julgado do STJ: Resp. 1.286.708 – PR, das palavras da relatora ministra Nancy Andrighi, em 27.05.2014.

  • Remisso

O art. 1.058 CC/02 traz a possibilidade de exclusão do remisso de maneira extrajudicial. Seria uma forma mais simplificada na qual apenas se devolve o valor que o sócio houver integralizado. Não há apuração de haveres, mas mera devolução, logo não há que se discutir participação em lucros. Porém se os remanescentes preferirem a exclusão do art.1.004, parágrafo único, esta se dará com apuração de haveres.

Dissolução parcial no CPC/2015

O art. 599 do CPC/15 traz os objetos possíveis à ação de dissolução parcial de sociedade.

Sobre os objetos, é possível que se busque apenas a apuração de haveres, em uma situação hipotética onde não haveria óbice quanto à saída do sócio. Da mesma forma seria possível discutir apenas a saída do sócio. O legislador não engessou a lei, e isto facilitou sua aplicação ao caso concreto.

A legitimidade ativa é expressamente apontada pelo artigo 600 do CPC/15. Vale o destaque que o cônjuge, companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou tem legitimidade ativa na apuração de haveres.

No que se refere a legitimidade passiva podemos dizer que quem não integra o polo ativo está automaticamente no polo passivo.

Sobre os polos da lide, a sociedade tem, obrigatoriamente, que estar em um dos polos. Cuidado com o parágrafo único do art. 601 do CPC/15, pois é possível fazer uma dedução errônea de que não seria necessário que a sociedade figure na lide quando, na verdade, a interpretação correta é que a sociedade não precisa ser citada, unicamente isto.

Para que se proceda a apuração de haveres, o juiz deve fixar a data de resolução da sociedade, que será:

  1. Em caso de morte, a própria morte;
  2. Em caso de exercício do direito de retirada, o sexagésimo dia;
  3. Em caso de exclusão, temos duas possibilidades: 1. A data da exclusão extrajudicial, no caso desta, e 2. No caso de exclusão judicial, a data da sentença.

Atenção, se houver tutela de urgência com afastamento de sócio, será a data da intimação da decisão de afastamento.

Não obstante, no caso de existir um contrato, o critério de apuração de haveres será definido à vista do que aponta o contrato, logo percebam a importância de sua correta elaboração.

Apuração de haveres

Temos 3 dispositivos que diretamente apontam que prevalece o contrato na apuração de haveres. São eles: Art. 604, II e 606 ambos do CPC/15 e o art. 1.031 CC/02. (Frise-se, novamente, a importante de um contrato bem elaborado.)

Porém, o que ocorre em casos de omissão do contrato quanto a apuração de haveres? No art. 606 e art. 1.031, já citados, há determinação que na omissão do contrato prevalece o valor patrimonial, e não o valor econômico.

Não obstante, temos, historicamente, precedentes do STJ entendendo que nas sociedades simples apura-se os haveres com base em balanço patrimonial que será levantado para verificar: ativo, passivo e saldo (como se fosse extinguir a sociedade), sem nenhum valor agregado e pagando o devido ao dissidente. Já nas sociedades limitadas (e demais empresárias) ter-se-ia que verificar o potencial produtivo, valor econômico, e o método mais usual sempre foi o fluxo de caixa descontado. O tribunal superior seguia essa linha porque havia uma preocupação que uma apuração que não refletisse a “mais-valia” poderia significar um enriquecimento ilícito da sociedade e o empobrecimento injustificado do sócio retirante, porém o fluxo de caixa descontado pode trazer muitas incertezas.

Para a doutrina especializada o critério patrimonial é o mais acertado com o princípio da preservação da empresa, enquanto o econômico pode trazer consequências ruins, como: enriquecimento indevido do sócio, incentivo à retirada de sócios. Portanto, observando a Lei e a doutrina especializada, se posicionou o STJ no Resp. 1.877.331 – SP, julgado em 13.04.2021 de que o critério de valor patrimonial deve prevalecer.

O entendimento adotado parece representar um novo e duradouro posicionamento pois se coaduna com o art. 606 do CPC e o art. 1.031 do CC/02 e representa maior compatibilidade com o princípio da preservação da empresa.

Tendo problemas jurídicos na sua empresa?

Agende uma consultoria empresarial e vamos proteger o seu negócio ainda hoje.